segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Analysis: The August war, two years later


August 8th, 2010 marks the second anniversary of the conflict that involved Georgia and Russia. While world attention was directed to the 2008 Beijing Olympics, the two neighbors of the Caucasus resorted to force to resolve the controversy concerning the status of the breakaway regions of South Ossetia and Abkhazia. At the time, a powerful information warfare waged by both sides prevented an evaluation about who would be the "aggressor" and the "victim". As the dust settled from the war, an independent commission, headed by Swiss diplomat Heidi Tagliavini, produced a detailed report seeking to recover the data concerning the conflict. The conclusion of the Tagliavini Report attributed to both sides the "blame" for the war: Georgia, for having initiated the attacks against separatist forces and Russian peacekeepers in South Ossetia; and Russia, for having provoked the Georgians and for answering disproportionately to Tbilisi's actions.

It behooves us to examine the consequences of this important conflict for the International Relations. First, in a time dominated by intrastate conflicts and the so-called "asymmetric warfare", the August War provided an example of a classical conventional conflict between two sovereign states.

The conflict was also a display of strength by Moscow, consequence of its resurgence as a world power from the 2000s on. If in the mid-1990s, the administration of Boris Yeltsin was unable to defeat the Chechen separatists in Russia's own territory, in 2008 the country has shown its ability to deploy forces to a theater of war beyond its territory.

The Russian victory assured the de facto independence of South Ossetia and Abkhazia. The juridical status of these two regions has been one of the most delicate issues of the post-war period. Russia finds itself immersed in its "Kosovo syndrome", claiming that the treatment the international community gave to Kosovo should be extended to South Ossetia and Abkhazia. The recent ruling of the International Court of Justice (ICJ) stating the compatibility of Kosovo's independence with international law should make the issue even more incendiary for the stability of Caucasus and Russia's relations with the United States and the European Union.

Apparently, the outcome of the war thwarted Putin's plans - but perhaps not those of Medvedev - to topple Georgian President Mikheil Saakashvili. This seemed to be one of the goals of Moscow's comprehensive response against Georgian territory - and not only against the two regions under dispute.

Tbilisi's defeat hindered Saakashvili's Western-leaning foreign policy objectives: Georgia's accession to NATO and possibly to the European Union. At the same time, it silenced the most serious challenge to Russian hegemony over its "near abroad". Furthermore, it sent a very clear message to extra-regional powers - namely, the United States - that they can not meddle into the affairs of countries within Kremlin's historical region of influence.

Finally, the disproportionate response of Russia must be understood within the context of the oil geopolitics of the region. The Baku-Tbilisi-Ceyhan (BTC) oil pipeline was designed to ensure the United States and Western Europe access to Azerbaijan's rich oil reserves bypassing Russia. Thus, the Russian operations in Georgian territory during the August War showed Moscow's intention to influence on the BTC, one of the major oil pipelines bypassing Russian territory.

The August War and the post-war period must be accurately contextualized in the constellation of interests of its actors. The power politics that led Russia and Georgia to war must be understood as the result of those interests, be they political, military, economic or prestige-seeking in the international system.

Urbi et Orbi: Posts in English


A partir de hoje, publicaremos nossas postagens também em inglês. Afinal, um blog sobre Relações Internacionais como o nosso deve ser acessível ao mundo, não é mesmo?

From today on, we will publish our posts in English as well. After all, a blog on International Relations like ours must be accessible to a broader readership, mustn't it?

domingo, 8 de agosto de 2010

Análise: A Guerra de Agosto dois anos depois

800px-2008_South_Ossetia_war_en.svgO dia de hoje (08 de agosto) marca os dois anos do início do conflito que envolveu a Geórgia e Rússia. Enquanto as atenções do mundo estavam direcionadas para os Jogos Olímpicos de Pequim, os dois vizinhos do Cáucaso recorriam à força para resolver a controvérsia concernente ao status das regiões da Ossétia do Sul e da Abcásia. À época, uma poderosa guerra de informação empreendida pelos dois lados impediu uma avaliação sobre quem seria o “agressor” e a “vítima”. Baixada a poeira da guerra, uma comissão independente, chefiada pela diplomata suíça Heidi Tagliavini, elaborou um detalhado relatório buscando recuperar os dados referentes ao conflito. A conclusão do Relatório Tagliavini atribuiu aos dois lados a “culpa” pela guerra: à Geórgia, por ter iniciado os ataques às forças separatistas e às tropas de paz russas na Ossétia do Sul; e à Rússia, por ter provocado os georgianos e por ter respondido desproporcionalmente às investidas de Tbilisi.

Cabe a nós analisar as consequências desse importante conflito para as Relações Internacionais. Primeiro, em um tempo em que predominam os conflitos intraestatas e as chamadas “guerras assimétricas”, a Guerra de Agosto proporcionou um exemplo de conflito convencional clássico envolvendo dois Estados soberanos.

O conflito também foi uma demonstração de força por parte de Moscou, consequência do processo de ressurgência do país como poder mundial a partir dos anos 2000. Se em meados dos anos 1990, o governo de Boris Ieltsin era incapaz de derrotar os separatistas chechenos em seu próprio território, em 2008 a Rússia mostrou capacidade de mobilizar forças para um teatro de operações além de seu território.

A vitória russa garantiu a independêndia de facto das regiões da Ossétia do Sul e da Abcásia. A situação jurídica dessas duas regiões tem sido um dos pontos mais delicados do pós-guerra. A Rússia se vê aqui imersa na sua “síndrome de Kosovo”, alegando que deve ser dado à Ossétia do Sul e à Abcásia o mesmo tratamento que a comunidade internacional deu a Kosovo. O recente parecer da Corte Internacional de Justiça (CIJ) indicando a compatibilidade da independência de Kosovo com o Direito Internacional deve tornar a questão ainda mais incendiária para a estabilidade do Cáucaso e para as relações da Rússia com os Estados Unidos e a União Europeia.

Ao que tudo indica, o desfecho da guerra frustrou os planos de Putin – mas talvez não os de Medvedev – de derrubar o presidente georgiano Mikheil Saakashvili. Esse parece ter sido um dos objetivos da resposta em larga escala que Moscou empreendeu contra todo o território georgiano – e não apenas contra as duas regiões em disputa.

A derrota de Tbilisi sustou os objetivos da política externa ocidentalista do presidente Saakashvili: a adesão da Geórgia à OTAN e, possivelmente, à União Europeia. Ao mesmo tempo, silenciou o mais sério desafio à hegemonia russa sobre o seu “exterior próximo”. Ainda, transmitiu um recado muito claro às potências extrarregionais – nomeadamente, os Estados Unidos – de que elas não podem se imiscuir na região histórica de influência do Kremlin.

Por último, a reação desproporcional da Rússia ao estender as hostilidades por todo o território georgiano deve ser entendida dentro do contexto da geopolítica do petróleo da região. O oleoduto Baku-Tbilisi-Ceyhan (BTC) foi concebido para garantir aos EUA e à Europa Ocidental o acesso às ricas reservas petrolíferas do Azerbaijão sem a necessidade de passar pela Rússia. Logo, as operações russas no território georgiano durante a Guerra de Agosto demonstraram a intenção de Moscou de influir no BTC, um dos mais importantes oleodutos que fazem o “bypass” sobre o território russo.

A Guerra de Agosto e o pós-guerra devem ser precisamente contextualizados na constelação de interesses dos agentes envolvidos. A “política de poder” (power politics) que levou a Rússia e a Geórgia à guerra deve ser entendida como a resultante desses interesses, sejam eles políticos, militares, econômicos ou de prestígio no sistema internacional.